quarta-feira, agosto 03, 2005

No DN de hoje

Aprender cinema
por Paula Martinheira

É consensual. O filme do actor e realizador italiano Roberto Benigni, A Vida É Bela, é o preferido dos alunos do 2.º ciclo do Algarve. "Porque é uma comédia e um drama. Porque nos faz rir, chorar e pensar." Ao argumento apresentado pelo Albano Batista, de 13 anos, estudante da Escola Básica Integrada e Jardim-de--Infância de Paderne, situada no interior do concelho de Albufeira, o professor António Silva, remata "O filme fê-los pensar, reflectir. Houve muitos que depois escreveram textos maravilhosos, não só de crítica à película, mas sobre a própria vida." "Tantas perguntas e tão poucas respostas", escreveu o André Martinho, da Escola EB 2, 3 D. Afonso III, em Faro. "Depois de ter visto o filme, fiquei sem perceber o título. Afinal a vida é bela?", interrogou-se.

É normal ver crianças de 11, 12 anos, a falar assim sobre cinema? António Silva, docente de Inglês, responde, peremptório "É normal, sim senhor, porque estes miúdos aprendem cinema desde o 5.º ano. Ao fim de dois anos de aprendizagem sobre história do cinema e linguagem e técnicas cinematográficas, para além do estudo de filmes, a estes alunos abriram-se novos horizontes, que lhes permitiram, aos poucos, desmontar a linguagem do cinema. E o mais importante é que, o que aprenderam em relação ao cinema, aplica-se também à televisão, tornando-os críticos e selectivos nos produtos que lhes são oferecidos, a maioria de fraca qualidade."

Mas, afinal, que miúdos são estes, que conhecem de cor e salteado a banda sonora do Serenata à Chuva, sabem que O Cantor de Jazz foi o primeiro filme sonoro da história do cinema ou que uma imagem de filme na película se chama fotograma? Graça Lobo, professora, dirigente do Cineclube de Faro e coordenadora do programa inédito em Portugal, denominado Juventude/ /Cinema/Escola, que desde há oito anos tem percorrido escolas algarvias do 5.º ao 12.º ano de todos os concelhos do Algarve, à excepção de Vi-la do Bispo, explica que se trata de alunos a quem foi ministrado o ensi- no do cinema. "No âmbito de uma ou mais disciplinas, os alunos vão quatro vezes à sala de cinema ver quatro filmes diferentes seleccionados para cada nível de ensino. Os do 6.º ano viram, por exemplo, este ano lectivo filmes tão distintos como Microcosmos, Serenata à Chuva, Sirga e o Rapaz Leão e A Vida É Bela.

"Estudaram-nos em diferentes perspectivas e aprenderam história, linguagem e técnicas. Hoje, estão de tal forma motivados para o cinema, que até já produzem pequenos filmes e documentários", sublinha, com inusitado orgulho, já que o programa foi gizado por si e pela colega do Cineclube, Anabela Moutinho.

Um outro olhar. E há ainda outra "grande vantagem", sustenta Graça Lobo. É que, para os estudantes do Interior, como Alcoutim ou Monchique, a iniciativa constitui a "oportunidade única de verem cinema, porque nos seus concelhos não há salas para o efeito", frisa. Mais "Para os miúdos que vivem no isolamento e estão longe de toda e qualquer forma de cultura, é de extrema importância ver filmes que lhes são inacessíveis, como os de Hitchcook, por exemplo", advoga a dirigente do Cineclube de Faro. O célebre Psico foi, aliás, segundo referiu, o filme de eleição entre os mais velhos, do secundário. "Acha natural um jovem, nos dias de hoje, preferir o Psico aos Matrix? Só mesmo aqueles que aprenderam a ver o cinema noutras perspectivas", advoga.

Outro aspecto considerado positivo deste programa prende-se com as "armas" que são dadas aos professores aderentes (as candidaturas são apresentadas às escolas, no início do ano lectivo, mas são nominais). Graça Lobo explica que todos os docentes que participam "gostam, à partida, de cinema". Contudo, é preciso dar-lhes formação para que possam assegurar as aulas. O docente da EBI/Jardim-de-Infância de Paderne, António Silva, contou ao DN que, "depois da formação dada pela dupla Graça Lobo/Anabela Moutinho, fiquei de tal forma motivado, que resolvi inscrever-me num mestrado sobre Literatura e Cinema, na Universidade do Algarve".

A Telma Pedro, a Sara Rodrigues, a Verónica Henriques, a Melissa Carneiro e a Cátia Sancho, alunas da EB 2, 3 Poeta Bernardo Passos, em São Brás de Alportel, ainda estão longe de mestrados e afins, mas enquanto se preparavam para apresentar, na festa de encerramento do programa, realizada em Faro, uma pequena peça de teatro baseada no filme Sirga e o Rapaz Leão, manifestavam ao DN o seu entusiasmo em relação às aulas de cinema, ao mesmo tempo que exibiam os seus conhecimentos sobre a área "Sabe o que é um plano picado?" Com um sorriso de vitória nos lábios, Graça Lobo, "a senhora do cinema", como é conhecida entre a classe discente, dispara: "Esta é a prova de que foi plenamente alcançado o grande objectivo do programa Juventude/Cinema/Escola - ver, aprender e amar cinema..."

Trinta escolas e 2500 alunos

O projecto que este ano envolveu 30 escolas algarvias, num total de 2500 alunos, começou com um estágio que Graça Lobo fez em França, país em cujas escolas decorreu durante 20 anos, o programa École au Cinéma e que serviu de inspiração para o Juventude/Cinema/Escola.

Esta iniciativa algarvia conta desde a primeira hora com a colaboração da Direcção Regional de Educação e do Instituto do Cinema, Audiovisual e Multimédia (ICAM), que financia o aluguer das salas de cinema que pertencem a exibidores ou a independentes, assim como o aluguer dos filmes exibidos. Mas o papel das autarquias tem sido também "essencial", já que são elas que asseguram o transporte dos alunos para os cinemas. É que os alunos de Alcoutim, no Nordeste algarvio, vêem os filmes em Vila Real de Santo António ou em Altura, situadas a mais de 50 quilómetros de distância.

Apoio a bairros de Lisboa e Porto

O Governo aprovou, ontem, em reunião de Conselho de Ministros, a iniciativa "Operações de qualificação e reinserção urbana de bairros críticos" destinada às áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. O investimento, a efectuar no período 2005-2007, será de 14,6 milhões de euros, com 12,5 milhões a serem assegurados através de candidatura no âmbito do Mecanismo Financeiro do Espaço Económico Europeu e o restante garantido por recursos nacionais.

O programa tem como alvo "bairros seleccionados em função das características e capacidades da acção locais", segundo o comunicado de Conselho de Ministros. Em cada bairro, será criado um grupo de trabalho para preparar o projecto de intervenção, "com foco na reabilitação e qualificação urbana habitacional, urbanística e ambiental".

Nos objectivos pormenorizados das operações verifica-se que a incidência dos investimentos privilegiará a construção de pequenos equipamentos que melhorem "a integração social das crianças e dos jovens", a disponibilização de "espaços adequados ao desenvolvimentos das actividades, incluindo as de natureza económica, dos residentes", acções de animação e apoio a iniciativas de natureza arquitectónica, urbanística e ambiental que "contenham uma dimensão inovadora significativa".

Vencedores do Prémio Jovens Músicos 2005 já são conhecidos

O Quarteto de Cordas da Escola Superior de Música do Porto e os intérpretes Jano Lisboa (violeta), Pedro Rodrigues (guitarra), Cândida Oliveira (clarinete) e Otto Pereira (violino) foram alguns dos vencedores do Prémio Jovens Músicos RDP- 2005, anunciou ontem a organização. O concurso, que cumpriu a sua 19.ª edição, teve a participação de 195 músicos de idades compreendidas entre os 15 e os 25 anos, oriundos de todo o País.

A concurso estiveram as seguintes modalidades violino, violeta, guitarra e clarinete de nível superior; violino e trompete de nível médio; música de câmara nos níveis médio e superior e acompanhamento de piano. Os candidatos eram oriundos de escolas profissionais de música, conservatórios, academias e escolas superiores de música e universidades, alguns deles a estudar no estrangeiro para aperfeiçoamento artístico.

Os galardoados com os primeiros prémios apresentar-se-ão a solo com a Orquestra Gulbenkian, a 1 de Outubro, no Concerto dos Laureados, sob a direcção de Osvaldo Ferreira. O Prémio Maestro Silva Pereira para aperfeiçoamento artístico fora do país, no valor de 2500 euros, será na ocasião disputado entre os solistas Otto Pereira, Pedro Rodrigues, Cândida Oliveira e Jano Lisboa.

O Prémio Jovens Músicos RDP 2005 tem o patrocínio da Fundação Calouste Gulbenkian e do BES.

Colónia de férias ao abrigo da poesia de Afonso Lopes Vieira

Até Setembro, as crianças da Marinha Grande voltam a ter direito à casa de férias que Afonso Lopes Vieira lhes deixou em testamento na praia de São Pedro de Muel. Foi essa a função que o poeta atribuiu à moradia onde passava mais de metade do ano e escreveu grande parte da sua obra literária.

O poeta confiou o legado à Câmara Municipal em 1938, mas este destinava-se aos filhos dos trabalhadores do concelho. E para que se cumprisse a sua vontade após a morte as indicações do documento eram bem precisas "Fosse ali instalada a colónia balnear para os filhos dos operários vidreiros, bombeiros e trabalhadores das Matas Nacionais."

Desde 2002 que a colónia balnear não funcionava. O edifício entrou em degradação e a câmara encerrou-o para obras de recuperação e musealização. Na segunda semana de Julho, o espaço reabriu com duas funções fundamentais preservar a casa que é um símbolo do poeta e da sua obra, tal como a família a deixou após a morte do escritor em 1946, e proporcionar momentos lúdicos e de lazer às crianças.

A recuperação do espaço custou 300 mil euros, um investimento cultural que permite manter, a partir de agora, a casa-museu aberta ao público. Ao visitante é oferecida a oportunidade de conhecer o ambiente em que o poeta escrevia, uma boa parte dos objectos pessoais que o rodeavam e o acervo dos livros. Reunidas em grupos de 26 em cada semana, até Setembro, 208 crianças, com idades entre os seis e os 14 anos, vão passar pelos campos de férias.

CASA-MUSEU. Três imóveis compõem a casa que o pai de Afonso Lopes Vieira ofereceu ao filho e à mulher, Helena Aboim, como prenda de casamento edifício residencial, instalações da colónia balnear infantil com camaratas e a capela. No primeiro andar fica a parte do museu: uma sala, o escritório e a varanda sobre o mar. Era nestes dois últimos espaços que o poeta se isolava para escrever, na "casa-nau", como lhe chamava.

"É uma figura da literatura nacional que está pouco estudada", diz o escultor Joaquim Correia, um dos "protegidos" do poeta durante o seu percurso de estudante em Lisboa e que se manteve como seu amigo ao longo de toda a vida.

Sem comentários: